Não é plágio, é releitura.
Para quem não sabe, a história de Conversa de Botas Batidas (Marcelo Camelo) inspirou-se em um caso que tornou-se famoso no Rio de Janeiro no ano de 2002. Apenas dois amantes foram as únicas vítimas da tragédia. Li o relato e quis contá-lo do meu jeito. (Sim, o Camelo é melhor nisso do que eu!)
Quem é maior que o amor?
Ela saiu cedo rumo ao trabalho. Mas não foi trabalhar naquele dia. Queria tanto encontrá-lo novamente, estar com ele, abraçá-lo. As saudades que sentia machucavam o peito. Estava disposta a , quem sabe , dá-lhe um ultimato. E de qual outra forma poderiam ficar juntos? Será que ainda havia tempo pra isso? A vida já havia deixado transcursar vários anos. Muitas primaveras haviam se passado desde o primeiro encontro deles. E cada um vivia a sua vida, se encontrando e se amando como podiam. Ele também foi lá. E, mais uma vez estavam os dois juntos. No rosto, misturava-se as marcas do tempo à alegria que viviam por se encontrarem uma vez mais. No coração, a certeza de que queriam ficar juntos. Eles não sabiam, mas seria de uma vez para sempre.
Como ela já tinha a decisão de exigir do seu amado uma posição sobre o reconhecimento daquele novo-velho amor, decidiu que não iria se deixar levar pelos seus carinhos. E logo depois do primeiro beijo daquele dia ela disse-lhe tudo que sentia. Em pouco tempo os carinhos deram lugar a discussão. Ele disse que não podia, que não tinha mais idade para recomeçar. Ela disse que ele era um covarde. Ele disse que ela não sabia compreender que o amor deles transcendia o encontro de dois corpos e que era a união de duas almas. Veio o choro de ambos, tomando o lugar do riso que antes habitava o corpo dos dois.
Ela, no entanto, já havia tomado a decisão: não esconderia seu amor por ele e iria desvencilhar-se de qualquer laço que a separasse do seu amado. Nos corredores podia-se ouvir mais choro e vozes exaltadas. Depois o silêncio. A reaproximação. Mais um beijo. A iniciativa foi dele. E ela acreditou que essa seria a resposta que almejava: ficariam, sim, juntos. Então se amaram. Em seguida, o sono, topor dos amantes. Adormeceram.
De repente um barulho veio lá de fora. Gritos, correria, buzinas, sirenes... o que poderia ser? Alguém estava à porta. Batia insistentemente. Ela levantou-se, queria ver o que estava acontecendo. Será que haviam descoberto seu segredo? Ele a deteve. Não a deixou seguir. Em vez disso, abriu a janela. Perceberam que algo grave estava acontecendo. Perceberam que tudo poderia desabar naquele momento. Mas tinha que ser justo naquele momento? Precisava ser logo agora, que havia decidido suportar as conseqüências ser aquilo que desejava ser? Necessitava acontecer agora, que havia decidido viver o seu amor até o fim? Como poderia imaginar que o fim se aproximava? Quiseram sair, pensaram em ir e retomar suas vidas esquecendo que haviam estado juntos naquele dia e em muitos outros. Mas a vontade de ficar era maior. Temiam o que os esperava lá fora. Lá fora tudo tem menos glamour. A decisão partiu dele. “Deixe que batam. Não vamos mais fugir do nosso amor. Não encontro motivos para isso.” Ela concordou. Ela também não queria ir. Sair dali era como esconder-se, e ela não queria, não precisava mais esconder seu amor. A vida passa, e termina. Que terminasse então com aquele alguém que ela amava tanto. Abraçaram-se. Voltaram a se amar. E, naquele abraço, não viram quando aquele lugar deixou de existir, virou destroços, ficou destruído. Mas, longe de ter sido o fim daquele amor, tal amor eternizou-se. E quem é maior que o amor?